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Em sua filosofia, Arthur Schopenhauer apresentou uma analogia intrigante conhecida como o Dilema do porco-espinho. Essa metáfora descreve a complexidade das relações humanas, destacando o desafio de equilibrar a proximidade com outros indivíduos sem se machucar.

Hoje, vamos explorar esse dilema de maneira profunda e extrair reflexões valiosas sobre as dores e as dificuldades intrincadas às conexões humanas. Confira a seguir!

O que é o dilema do porco-espinho?

Schopenhauer, ao contemplar a natureza humana, comparou-a à condição dos porcos-espinhos em uma noite fria. Esses animais buscam calor uns nos outros, mas, ao se aproximarem demais, acabam se ferindo com os espinhos. Em certa instância, a metáfora ilustra o desafio inerente de manter relacionamentos próximos sem experimentar as dores do contato. Vale dizer que a metáfora de Schopenhauer inspirou a imaginação de Sigmund Freud, que a difundiu como o “dilema do porco-espinho”, tal qual conhecemos hoje.

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Para Freud, essa parábola encapsulava uma percepção crucial sobre a psicologia humana – ao buscar intimidade, frequentemente afastamos os outros. Ao eliminar as barreiras da etiqueta e da sociedade educada, muitas vezes nos encontramos irritando uns aos outros.

O dilema do porco-espinho e a dificuldade da convivência humana

Parerga e paralipomena Schopenhauer

Em sua obra de 1851, “Parerga e Paralipomena”, Schopenhauer contempla uma diversidade de temas filosóficos, abordando, entre eles, a natureza muitas vezes tensa das relações humanas. Para elucidar seus pensamentos, o filósofo alemão compartilha a famosa parábola que envolve um conjunto de porcos-espinhos. Ele narra:

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“Em um dia frio de inverno, vários porcos-espinhos se amontoaram bem próximos uns dos outros para, por meio de seu calor mútuo, evitar o congelamento. Mas logo sentiram o efeito de seus espinhos uns sobre os outros, o que os fez se afastar novamente”

Os porcos-espinhos buscam uns aos outros para se aquecer, conforme relata Schopenhauer. No entanto, ao se aproximarem, acabam se cutucando e incomodando mutuamente com seus espinhos afiados, resultando em separação devido ao incômodo e à dor. Diante dessa situação, Schopenhauer prossegue:

“Agora, quando a necessidade de calor os uniu novamente, a desvantagem dos espinhos foi repetida, de modo que eles foram jogados entre dois males, até que descobriram a distância adequada a partir da qual poderiam tolerar melhor um ao outro”

Sendo assim, os porcos-espinhos chegam a um acordo: ficam próximos o bastante para se aquecerem, mantendo uma distância suficiente para minimizar os arranhões. Schopenhauer, sem rodeios, estende esta metáfora à sociedade humana:

“Assim, a necessidade de sociedade, que surge do vazio e da monotonia da vida das pessoas, as une; mas suas muitas qualidades desagradáveis e repulsivas e seus inconvenientes insuportáveis mais uma vez as afastam”

Do porco-espinho ao humano: o que o dilema nos ensina?

Ainda que busquemos a interação humana, o esforço para cultivar intimidade ou vulnerabilidade muitas vezes resulta em frustração e desilusão. Nos ferimos e incomodamos mutuamente com nossas diversas necessidades e opiniões, antes de chegarmos a um entendimento, de forma semelhante aos porcos-espinhos. Afirma Schopenhauer:

“A distância média que [as pessoas] finalmente descobrem, e que lhes permite suportar a convivência, é a polidez e as boas maneiras. Na Inglaterra, diz-se a quem não se mantém fiel a isso que “mantenha distância”. Em virtude disso, é verdade que a necessidade de calor mútuo será satisfeita apenas de forma imperfeita, mas, por outro lado, a picada dos espinhos não será sentida”

As boas maneiras e a etiqueta surgem para atenuar a rudeza de nossos desejos e demandas individuais. No entanto, uma sociedade tão polida também impede a manifestação de qualquer intimidade ou conexão genuína. Assim, surge o dilema: buscamos uma ligação autêntica, mas muitas vezes só conseguimos tolerar uma forma de proximidade moderada. Em suma, todos nós precisamos e nos suportamos mutuamente.

Como superar o dilema do porco-espinho: o poder de estar sozinho

Filósofo pessimista que era, ao invés de suportar as maneiras irritantes das pessoas, Schopenhauer sugere que devemos aceitar nossas perdas e nos retirar completamente para a solidão, concentrando-nos em criar calor para nós mesmos. Segundo o filósofo:

“No entanto, quem tiver uma grande quantidade de calor interno próprio preferirá manter-se afastado da sociedade para evitar causar ou receber problemas ou aborrecimentos”

Para Schopenhauer, quem necessita da presença dos outros quando se pode desfrutar da própria companhia? Em sua concepção, tudo o que procuramos em termos de conexão pode ser alcançado por meio de uma forma refinada de solidão.

Assim, na filosofia schopenhaueriana, a solidão pode se tornar ainda mais gratificante à medida que desenvolvemos nosso intelecto e aprofundamos nossa apreciação pela arte. Podemos dedicar nosso tempo à leitura, à música, apreciando as maiores realizações culturais da humanidade, sem jamais ter que enfrentar ou ser perturbados por outros seres humanos. Mas, que fique a ressalva:

“A solidão será bem-vinda, suportada ou evitada, de acordo com o valor pessoal de um homem, seja ele grande ou pequeno – o infeliz sentindo, quando está sozinho, todo o peso de sua miséria; o grande intelecto se deleitando com sua grandeza; e todos, em suma, sendo exatamente o que são”

Curtiu esse conteúdo e quer acessar mais reflexões filosóficas? Então, continue navegando pelas nossas postagens aqui do site. Até mais!

Gabriel Mello

Sou doutorando em Letras e mestre em Filosofia pela Universidade Estadual de Maringá. Valendo-me da alma inquieta de um filósofo e dos despropósitos de um menino que carrega água na peneira, escrevo sobre as grandes questões e temáticas da Filosofia e da Literatura.

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